Factor Rua - Da favela para o mundo

Estamos naquela altura do ano em que qualquer adepto de futebol sonha com os novos "cromos" que irão colorir as cadernetas da próxima época desportiva. A pré-temporada está em marcha e todos os dias são apontados inúmeros jogadores para as maiores equipas de Portugal e da Europa. 

Um dos nomes indicados pela imprensa esta semana para o Sport Lisboa e Benfica é o do brasileiro Patrick de Paula, um jovem médio de 20 anos que se tem mostrado a um bom nível no Palmeiras, tendo inclusive assumido a titularidade no meio-campo do Verdão no campeonato Brasileiro, depois de excelente réplica que deu no Paulistão 2020. Um médio de alta rotação, com capacidade para desempenhar funções de 6 (médio defensivo) e de 8 (box-to-box). É talvez este último papel que mais interessa ao treinador Jorge Jesus. 

À primeira vista, nada de anormal. São apontados milhares nomes de jogadores aos clubes portugueses e europeus todos os anos, muitos deles sem qualquer fundamento. 
Mas por traz desta possível transferência, está a história de um jogador que tem tendência para acabar.

Patrick de Paula Carreiro, nascido no Rio de Janeiro a 8 de Setembro de 1999 não fez o percurso que para muitos é normal nos dias de hoje. Não entrou cedo nas camadas jovens de nenhum clube. Não fez a formação como jogador nem lhe foram passadas todas as ideias pré-feitas e pré-concebidas da nova geração de treinadores, ultra-preocupados com o treino e com a táctica. Não foi mecanizado.
Cresceu livre e jogou solto o futebol de rua que parece desaparecer na maioria dos países mais desenvolvidos. Jogou descalço, ao frio e à chuva ou no calor abrasador do país irmão. Desenvolveu a sua técnica pelas favelas cariocas, fintando os perigos e marcando golos que lhe valeram voos mais altos. 

Foi no Campeonato Carioca de Futebol Amador sub-17 de 2016 que Patrick se mostrou a quem o quis ver. Jogando pelo Cara Virada Futebol Arte, equipa do bairro de Santa Margarida, não deixou créditos por mãos alheias. Chamaram-lhe de "Pelezinho" pela qualidade e por usar a camisa 10 do Rei Pelé. A jogar no miolo, ajudou o seu "time" a vencer o torneio e marcou 18 golos na competição que lhe garantiram o prémio de "maior Artilheiro".

Felizmente, as principais equipas do Brasil estão atentas a estes torneios organizados pelas federações estaduais, tentando encontrar os jogadores perdidos mas com magia nos pés. Muitos são aqueles que fazem testes, até ficam durante algum tempo mas acabam por se perder no tempo e no espaço. Para os que têm de mudar de estado, não conseguem suportar ficar longe do sitio onde cresceram. Para outros, a vida de atleta de alta competição não se coaduna com alguns dos seus hábitos. Por muito talento que tenham, para atingir outro "patamar" não basta os toques na bola. 

Mas neste caso, de Paula teve o interesse do Palmeiras que rapidamente fechou negócio. No dia seguinte ao fim do torneio, partiu para São Paulo e instalou-se no Centro de Treinos do clube, onde ficou a viver. O ano de 2017 foi de adaptação a uma nova realidade, a uma nova cidade, a um novo futebol.
Mas o talento estava lá e, felizmente, a mentalidade também.
No ano seguinte, estabeleceu-se na equipa sub-20 e por lá ficou dois anos até chegar a oportunidade de vestir a principal do Alviverde. 

Com 20 anos, é considerado uma das maiores promessas do Brasil. No passado Domingo, apontou o golo da vitória (2-1) do Palmeiras frente ao Santos, o derby Paulista, onde actuou os 90 minutos.

Não sabemos onde é que Patrick chegará no mundo de futebol. Parece ter qualidade para voos longínquos, quem sabe, num grande clube europeu. No entanto, já atingiu o patamar máximo no futebol brasileiro e logo num dos históricos daquele país. Serve de exemplo para os meninos e meninas que ainda jogam na rua, imitando os seus ídolos, vestindo a pele de "Messis", "Ronaldos", "Pogbas", "Neymars". 
Um futebol que para o bem do futebol (passando-se o pleonasmo) espero que não acabe.
E que mais Patricks apareçam. 

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